segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Responsabilidade do Projetista nos Contratos de Empreitada

Para toda a obra, há a necessidade de elaboração de projetos, que servem para viabilizar tecnicamente a construção e orientar ao construtor a sua execução. Para as obras de porte, surge a figura do autor do projeto ou projetista, pois, nestes tipos de contrato, é comum que o executor não seja quem definiu ou projetou o serviço, cabendo apenas ao empreiteiro a execução.
Há uma outra relação contratual entre o dono da obra e o projetista, a quem cabe apenas projetar, dimensionar, calcular, quantificar materiais e especificar quais as técnicas construtivas necessárias para a idealização do projeto, podendo também, fiscalizar a construção. Na visão de Arnaldo Rizzardo, tem grande importância a análise do papel desempenhado pelo projetista na análise da responsabilização por danos,

É possível que a causa das deficiências e dos danos se encontre na má elaboração do projeto, ou nos cálculos equivocados do engenheiro, ou nas projeções descabidas do arquiteto. Grande parte dos defeitos de construção tem sua origem em erros de projetos e de cálculos, envolvendo as fundações e a concretagem, comprometendo a estrutura da obra. Calcula-se equivocadamente a quantidade de massa, de ferros, de cimento e outros ingredientes nas fundações, na estrutura, nas colunas. Não se faz a correta proporção entre o peso do prédio e o diâmetro das pilastras ou colunas de sustentação. No caso, as falhas desses profissionais ou empresas contratadas deram causa a equívocos e defeitos, com o uso insuficiente de ingredientes na confecção de materiais para a base, ou para a estrutura, ou as colunas de sustentação. (RIZZARDO, 2006, p. 536)

Surge então, no rol de quem pode ser responsabilizado, o projetista, pois por um erro de projeto, má especificação, não observância de normas ou cálculo incorretos, repassar informações, estas através dos projetos e memoriais descritivos, ao empreiteiro, e este, seguir as orientações, causar problemas na solidez da obra, que resultem em dano, responderá o projetista, como assim foi decidido pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina no caso concreto,

RESPONSABILIDADE CIVIL. REPARAÇÃO DE DANOS CAUSADOS POR FALHAS NA FUNDAÇÃO DE PRÉDIO EM CONSTRUÇÃO. ERROS CONCEBIDOS EXCLUSIVAMENTE A PARTIR DO PROJETO FORNECIDO PELA EMPRESA DONA DA OBRA. CONTRATO DE EMPREITADA DE MATERIAIS E MÃO-DE-0BRA QUE ISENTA A CONSTRUTORA DE RESPONSABILIDADE REPARATÓRIA. INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 159 E 1.245, AMBOS DO CÓDIGO CIVIL. PEDIDO INDENIZATÓRIO ACOLHIDO. APELO PROVIDO.
1 - Segundo a abalizada doutrina de Hely Lopes Meirelles, os erros de concepção ou de cálculo de cargas e resistências do projeto de engenharia torna o seu autor, por dolo ou culpa, responsável pelos danos à obra que deles decorrerem.
2 - Sendo assim, se a dona do prédio aciona apenas a construtora, responsável pela execução do projeto que previamente encomendara junto a terceiro, e, bem assim, o contrato entre ambas é de empreitada de materiais e mão-de-obra, o pedido indenizatório é de ser negado, tanto mais porque, na hipótese, a construtora optou pelo não chamamento do projetista a intervir no feito.(TJSC, Apelação nº 1988.078871-1, Relator Des. Eládio Torret Rocha, 28/04/99, Câmara Civil Especial.)

Também, pode haver situações onde o responsável técnico pela construção e o projetista serem responsabilizados solidariamente pelos problemas na obra, como no julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo,

INDENIZATÓRIA - REPARAÇÃO DE DANOS - HIPÓTESE DE OCORRÊNCIA DE TRINCAS E RACHADURAS QUE COMPROMETEM A OBRA, SENDO ACONSELHÁVEL A SUA DEMOLIÇÃO - PERÍCIA DEMONSTRANDO A CULPA NOS SERVIÇOS TÉCNICOS DE ENGENHARIA, RELATIVOS À FUNDAÇÃO DA OBRA - SOLIDARIEDADE PASSIVA ENTRE O ENGENHEIRO RESPONSÁVEL TÉCNICO E O ENGENHEIRO CONTRATADO ESPECIFICAMENTE PARA A ELABORAÇÃO DO CÁLCULO ESTRUTURAL - AUSÊNCIA DE CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR - OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR CARACTERIZADA - MANUTENÇÃO DO QUANTUM FIXADO NA R SENTENÇA - PEDIDO PARCIALMENTE PROCEDENTE - RECURSO NÃO PROVIDO DESERÇÃO - IRRECORRIDA A DECISÃO DE 1O GRAU QUE AFASTOU A CONCESSÃO INCIDENTAL DE JUSTIÇA GRATUITA, O NÃO RECOLHIMENTO DAS CUSTAS DO PREPARO DA APELAÇÃO IMPLICA DESERÇÃO - RECURSO NÃO CONHECIDO
[...]Não há motivos para afastar a solidariedade da condenação, já que ambos os engenheiros eram responsáveis, um pela fiscalização e outro pela própria efetivação dos serviços de fundação da obra, observando-se que aqui não há presunção de solidariedade. Ela resulta tanto da Lei, como do contrato, a teor do artigo 265, do CC.[...] (TJSP, Apelação nº 7153251300, Relator Des. Rubens Cury, 01/12/08, 18ª Câmara de Direito Privado)

No caso de fiscalizar a obra, como previsto no artigo 622 do Código Civil e não tomar providências pelos erros observados durante a execução será então, responsabilizado pelo vício, limitado aos danos resultantes, como previsto na parte final do art. 622 que remete as responsabilidades previstas no art.618, in verbis:

Art. 622. Se a execução da obra for confiada a terceiros, a responsabilidade do autor do projeto respectivo, desde que não assuma a direção ou fiscalização daquela, ficará limitada aos danos resultantes de defeitos previstos no art. 618 e seu parágrafo único.

Trata assim Caio Mário quanto aos direitos e deveres do projetista, destaca as duas formas que a legislação, em seu artigo 622, se relaciona com o executor da obra, observa que “o projetista dirige e fiscaliza a obra, ou fica limitado ao projeto, sem qualquer participação na sua execução.”

Além do dono da obra e do empreiteiro, é comum a obra resultar de relação jurídica que envolva uma terceira pessoa, o seu projetista. Muitas vezes a obra é projetada e executada pela mesma pessoa, situação em que todas as responsabilidades acima explicitadas nela se concentram. Pode a obra ser projetada por uma pessoa e executada por outra. Nesta hipótese ocorrem duas variantes, ou o projetista dirige e fiscaliza a obra, ou fica limitado ao projeto, sem qualquer participação na sua execução. Na primeira variante, responde o projetista pelos danos que causar ao dono da obra, tanto por vícios ou defeitos do projeto, quanto por omissões na fiscalização da execução da obra. Na segunda variante, conforme expressamente dispõe o art. 622 do Código, o projetista responde apenas pela solidez e segurança da obra, na forma do art. 618, naquilo que diga respeito a características do projeto. (MÁRIO, 2002, p. 71)

Em caso concreto, foi julgado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, ocorrendo que o projetista apenas elabore o projeto, não pode ser responsabilizado pelos problemas da construção de obra que não foi contratado para fiscalizar.

RESPONSABILIDADE CIVIL. DEFEITO EM CONSTRUÇÃO. AÇÃO MOVIDA POR ADQUIRENTES DE IMÓVEL CONTRA ENGENHEIRO RESPONSÁVEL PELO RESPECTIVO PROJETO. IMPROCEDÊNCIA. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE CULPA DO RÉU, CONTRATADO PARA, TÃO-SOMENTE, ELABORAR E APROVAR O PROJETO JUNTO AOS ÓRGÃOS COMPETENTES, SEM OBRIGAÇÃO DE FISCALIZAÇÃO DAS DEMAIS ETAPAS CONSTRUTIVAS. DANOS DECORRENTES DA MÁ QUALIDADE DO MATERIAL EMPREGADO. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
[...]Ora, não havendo demonstração de que o réu tivesse tido qualquer participação nos danos verificados no imóvel, ou de que houvesse agido com imprudência, negligência ou imperícia na realização do projeto, a improcedência da ação era de rigor. [...] (TJSP, Apelação nº 3246004600, Relator Des. José Roberto Bredan, 30/10/2008, 2ª Câmara de Direito Privado)

Não é permitido ao dono da obra ou ao empreiteiro modificar, acrescer ou reduzir o projeto, desde que seja de monta significativa, sem que tenha sido aprovado pelo projetista. As alterações de pouca monta no parágrafo único do artigo 621 do Código Civil, trata de alterações de pequeno impacto no conjunto da obra e que não descaracterizem o projeto, como por exemplo, a alteração do material utilizado para o revestimento interno de paredes e pisos. A legislação permite esta alteração apenas que seja por motivos supervenientes ou razões de ordem técnica, in verbis:

Art. 621. Sem anuência de seu autor, não pode o proprietário da obra introduzir modificações no projeto por ele aprovado, ainda que a execução seja confiada a terceiros, a não ser que, por motivos supervenientes ou razões de ordem técnica, fique comprovada a inconveniência ou a excessiva onerosidade de execução do projeto em sua forma originária.
Parágrafo único. A proibição deste artigo não abrange alterações de pouca monta, ressalvada sempre a unidade estética da obra projetada.

Portanto, danos que resultem desta alteração do projeto base, sem o devido estudo, responderá pelos danos, aquele que o modificou.
No caso do projetista estar fiscalizando a obra e constatar a alteração não autorizada, lhe reserva o direito de impedir a continuidade da obra ou ser ressarcido por eventuais danos. Para Caio Mario da Silva Pereira, tal regra prevista no artigo 622, difere do previsto na lei de Direitos Autorais,

Esta é uma regra típica de direito autoral, em que o legislador deu tratamento diverso do que se encontra na Lei de Direitos Autorais (Lei nº 9.610/98), a qual, no seu art. 26, não concede ao autor do projeto arquitetônico o direito de impedir modificações no projeto, mas apenas o direito de repudiar a sua autoria caso sejam efetivadas modificações sem o seu consentimento, podendo ser indenizado pelos prejuízos que sofrer com o eventual reconhecimento público da sua autoria. O Código não revoga o art. 26 da Lei nº 9.610/98, mas apenas possibilita ao autor do projeto impedir a execução da obra que está se distanciando do seu projeto, restando a este sempre optar pela via do repúdio e eventual indenização pelas perdas e danos que tiver sofrido. (PEREIRA, 2002, p. 71)

Pode optar o dono da obra ou a empresa que gerencia o projeto, a qual já se torna prática nos canteiros, a contratação de uma empresa especialista em fiscalizar a execução dos serviços conforme projetado, e que esta pode também, entrar no rol de responsabilização, caso ocorra danos oriundos a omissão na fiscalização dos serviços.

Eduardo Pizzatto Schultz
Advogado OAB/PR nº 45.016
adv.eduardopizzatto@yahoo.com.br

Bibliografia:

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. 1ª Ed. Eletrônica. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2002.
RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade Civil. Rio De Janeiro: Editora Forense, 2006.